sexta-feira, 29 de agosto de 2014

os barcos depois da tempestade




no outro dia encontrei-a
em um porto pacífico
uma laguna plácida enchia nossos olhos
como contraste à turbulência da sombra

ela descobrira missivas de sangue
que eu deixava às portas dos sonâmbulos
queria conhecer o lancinante guerreiro
que não sabia lutar

mesmo sem conhecê-la até então
reconheci a amiga de várias infâncias
e consorte do mesmo embate
recitei meus diálogos com recessos escuros
do meu destino amassado
enferrujado em campo baldio

ela me contou de versos esparsos e seus signos:
uma rainha destronada
em busca de um reino e do tempo
lutando contra amplitudes
triste insone
furando na densa cortina da noite
caminhos para a luz

tarde de encontrar tesouros perdidos num naufrágio
tínhamos o mesmo estigma
e o mesmo gládio sóbrio

“está um dia bonito, a vida tomando forma
e teu rosto será sempre meu princípio
e a inspiração para um bravo recomeço”

“eu serei tua direção espiritual teu conforto
o espelho do teu medo
e a cura deste medo
tua calma
e crescerei ao teu lado
pois também tenho enfrentamentos
tenho desentranhado mitos muitos
do coração”

ela revelou profundezas
e o licor de algures
ficou na taça esquecido
mas minha alma se encheu de esperança
eu não estaria sozinho na contenda

juntamos as mãos num gesto
novo e ancestral
nos reconhecemos, afinal
e a solidão foi um barco que partiu vazio
com sobras de outros dias
com nossos despojos

caminhamos juntos de mãos dadas
ao pôr do sol
seguiremos caminhando
no breve tempo de existir
mesmo que não haja sol.


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